(…) Eu acredito que a vida de um ser humano passa necessariamente por três fases: tentativa, queda, superação (...) A gente se torna no se torna porque primeiro passa por uma espécie de tentativa. E nessa tentativa vamos tendo uma espécie de quedas, que são “fracassos”, mas se a gente insiste e se dedica naquilo que quer, passamos para outra fase, que é a de superação.” Estas palavras, mais do que explicarem a visão do Khronic sobre o percurso natural do homem enquanto ser vivo, trazem a essência do que se pode encontrar no álbum “Tentativa, Queda, Superação”, seu primeiro trabalho discográfico lançado em Outubro deste ano -2013.
Certamente que este nome – Khronic – não soará estranho para os amantes de Hip Hop nacional. Mas considerando a possibilidade disso acontecer deixe-me primeiro dizer que trata-se de um rapper moçambicano que se tem feito notabilizar nos meandros da cultura Hip Hop. Khronic nasceu em Tete, Centro do país, cresceu na capital Maputo, no Sul, e actualmente reside na província de Nampula, no Norte. Isto para dizer que o nigga já percorreu todas as regiões deste rochedo à beira do Índico. Lá para o início da década 90, este emcee, por influência de um tio seu, começava a ter seu primeiro contacto com RAP, sem no entanto, imaginar que um dia se tornaria num fazedor deste estilo musical.
Criss Cross assim como os Naughty By Nature são os primeiros que ele escutou, mas foram 2Pac (Dear mama) e Coolio (Gangstar paradise), que na altura figuram a playlist do Hip Hop no mundo, sua grande influência e, se calhar, os responsáveis a pela sua entrada nesta cultura, que em Moçambique, praticamente ainda não tinha expressão.
Um pouco mais tarde e movido pelo desejo de libertar as suas emoções e experiências de vida, Khronic experimenta a poesia escrevendo os primeiros textos que mais tarde se tornariam nas suas primeiras músicas.
Com o decorrer do tempo, já em Maputo foi mantendo mais contacto com niggas que gostavam e faziam o mesmo que ele e com estes criou familiaridades artísticas. Foi nesta senda que originou-se o grupo Almas Habitantes ao lado de Prime Akhim, Dj Speech, Seiva, Naparama, Plus e Vate, depois de ter fracassado o seu primeiro grupo constituído por dois elementos.
Mas para a melhor compreensão desta trajectória recomendo que esperemos pelo documentário que o rapper está a preparar narrando seu percurso dentro da cultura Hip Hop até altura do surgimento do seu primeiro álbum: Tentativa, Queda, Superação. E por falar em álbum, este é na verdade a razão de toda essa digressão de palavreados.
Tentativa, Queda, Superação é uma refeição bem preparada e bem servida para quem gosta de ouvir um bom rap clássico – bons beats acompanhadas de letras conscientes e didácticas. O flow, quanto a mim, não está bem afiado, mas isso é compensado pela qualidade de uma escrita que se foi lapidando ao longo do tempo. Facto que, aliás, está evidente no trabalho.
Para mim, o que marca os versos de Khronic, neste álbum, é a simplicidade com que ele desfia assuntos complexos, sem se divorciar do seu princípio de fazer músicas didácticas/conscientes.
Contrariamente à expectativa que alguns alimentavam de receber um álbum mais agressivo, Khronic brinda os seus seguidores com um trabalho que pelo seu carácter temático está a altura de todas as camadas sociais. Nalgumas vezes ele recorre ao cliché e ao que podemos considerar intertextualidade na sua escrita. Versos como “não faço música de momento/ Faço do momento um som; ou então, “Tudo vale a pena se a alma não é pequena” mostram a sua familiaridade com o que os outros escrevem ou cantam.
E como que a querer garantir que a mensagem não passará despercebida, Khronic repete, pelo menos, nas primeiras três faixas o adágio popular que diz “o que não mata fortifica”, uma expressão que sentencia a tema central do álbum. Neste trabalho, o emcee convida a todos a manter a crença de que não importa quantas vezes nós caímos o essencial é termos a capacidade de levantarmos e persistirmos no que queremos. Esta, é de resto, a filosofia de vida que Khronic procura transmitir.
Mas um dado que para muito poderá ser curioso é que neste álbum o elemento do grupo Almas Habitantes aparece também como produtor. Aliás, é preciso mencionar que neste aspecto Khronic não decepcionou. A faixa número 4, que para mim é a melhor na primeira parte do álbum, foi produzida por ele.
Quanto às participações, o rapper foi buscar alguns nomes como Shacal, Fuga (dos Matsangas), F-Kay, Rui Michel, 2 Head, Cindy, o brasileiro Leopac . Entretanto, a presença de Olho Vivo no interlúdio que encerra a primeira parte do disco foi uma escolha muito acertada. Olho faz uma miscelânea das três faixas que compõe esta parte do álbum e dá uma ideia geral do que trata o álbum recorrendo a uma fórmula mágica no discurso que só ele podia fazer.
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